top of page

Genética e Câncer

Todos os cânceres são causados por alterações nos genes. Os genes informam às células do nosso corpo quais proteínas devem ser utilizadas para cada tipo de célula e suas necessidades. Alguns genes dizem ao organismo como corrigir os danos acumulados, ao longo do tempo, durante o envelhecimento normal, como toxinas ambientais, exposição ao sol, fatores dietéticos, hormônios e outras influências. Estes genes de controle dos danos podem reparar às células ou informar às mesmas quando parar de crescer e morrer se houverem demasiados danos a reparar. Quando os genes estão danificados, podem aparecer alterações denominadas mutações. Quando essas mutações ocorrem nos genes, as células podem crescer fora de controle causando o câncer. Para a maioria das pessoas que desenvolvem câncer, as mutações genéticas acontecem ao longo da vida. Algumas pessoas nascem com uma mutação genética herdada de um dos pais, que aumenta seu risco de ter câncer. Quando o câncer ocorre devido a uma mutação herdada, é denominado câncer hereditário. O que é câncer hereditário? Todas as pessoas têm duas cópias de cada gene, uma de cada pai. A maioria das pessoas nasce com duas cópias normais de cada gene. Os cânceres hereditários ocorrem quando uma pessoa nasce com alterações ou mutações em uma cópia de um gene de controle de danos que normalmente protege contra o câncer, geralmente essas alterações são herdadas da mãe ou pai. Pessoas com uma alteração genética herdada têm 50% de chance de passar a mutação para cada um dos seus filhos. Essas alterações podem aumentar o risco de câncer, mas não aumentam o risco para cada tipo de câncer, e nem todas as pessoas que nascem com uma alteração num gene desenvolverão a doença. A comunidade científica utiliza o termo susceptibilidade genética para descrever o risco aumentado para câncer em pessoas com uma mutação hereditária.


As síndromes de câncer hereditário são afecções genéticas, nas quais neoplasias malignas tornam-se mais prevalentes em indivíduos de uma mesma família. Elas ocorrem por transmissão vertical (de uma geração para outra), por meio de um padrão de herança mendeliano bem definido, em geral do tipo autossômico dominante, ou seja, 50% de risco de transmissão para a prole em cada gestação, independentemente do sexo. Apresentam, também, elevada taxa de penetrância: o indivíduo portador da mutação tem um risco elevado de desenvolver lesões associadas à síndrome durante toda a vida. Algumas características estão associadas ao câncer hereditário, como: idade precoce ao diagnóstico, mais de uma neoplasia em um mesmo indivíduo, vários membros de uma mesma família apresentando a mesma neoplasia ou neoplasias relacionadas e múltiplas gerações acometidas.

Câncer Hereditário x Câncer Esporádico O câncer é uma doença comum, assim a maioria das famílias tem algum membro que já teve a doença, mas isso não significa que o câncer seja hereditário. Não sabemos a causa da maioria dos cânceres, mas especialistas acreditam que cerca de 10% da maioria dos tipos de câncer são devido a alterações hereditárias. O câncer que não parece ser causado por alterações herdadas é denominado câncer esporádico. Acredita-se que a maioria (talvez 90%) de todos os cânceres sejam esporádicos. Isto significa que mesmo se o câncer não é encontrado em uma família, um membro dessa família ainda pode ter um risco para algum tipo de câncer durante a vida. O câncer esporádico e o hereditário diferem de várias maneiras o que pode afetar as decisões sobre os cuidados e tratamentos:

  • O câncer hereditário ocorre frequentemente de forma mais precoce do que o câncer esporádico do mesmo tipo, por isso se recomenda a realização do rastreamento frequente em pessoas mais jovens com antecedentes de câncer hereditário na família.

  • Os cânceres hereditários são causados em parte pelas alterações genéticas transmitidas de pais para filhos. Acredita-se que os cânceres esporádicos resultam de danos adquiridos através de exposições ambientais, fatores dietéticos, hormônios, envelhecimento normal e outras influências. A maioria das alterações genéticas não é compartilhada entre parentes ou transmitidas aos filhos.

  • As pessoas que herdam uma alteração num gene podem ter um risco aumentado para mais de um tipo de câncer. Para sobreviventes de câncer, isto pode afetar as opções de tratamento da doença ou os cuidados de acompanhamento.


Células normais e neoplásicas


A palavra neoplasia - nome científico do câncer ou tumor maligno - significa 'novo crescimento'. A diferença mais significativa entre uma célula normal e uma neoplásica é que o crescimento ou proliferação dessa última persiste mesmo na ausência de fatores de crescimento. No entanto, para que as células se tornem malignas não basta que elas se multipliquem em excesso. Elas precisam ignorar as restrições de crescimento impostas pelas diferentes partes do organismo, em especial células vizinhas normais.


O que realmente distingue um câncer benigno de um maligno é a capacidade deste de invadir outros tecidos e formar novos tumores. Por isso, considera - se neoplásica uma célula que adquire as seguintes vantagens metabólicas:

1- perda do controle da proliferação e divisão celular;

2- imortalização celular, devido a ativação da enzima telomerase;

3- presença de alterações (de forma e número) nos cromossomos;

4- perda das propriedades adesivas da membrana plasmática, que permite o reconhecimento célula-célula e a inibição por contato do movimento e crescimento celular;

5- perda da função e da capacidade de diferenciação ou especialização;

6- capacidade para invadir o tecido vizinho e formar metástases;

7- capacidade de angiogênese.

Oncogenes e genes supressor de tumor

As alterações genéticas que promovem o desenvolvimento de câncer ocorrem em duas classes de genes reguladores do crescimento, que estão presentes em células normais: os proto-oncogenes, que promovem o crescimento e os genes supressores de tumor, que inibem o crescimento celular. Alterações nos proto-oncogenes e nos genes supressores de tumor podem provocar desenvolvimento de células com crescimento descontrolado.


Os oncogenes foram primeiramente descritos em genoma retroviral que induziam tumores em animais. Estes genes foram chamados de oncogenes virais (viral oncogenes, v-oncs). Posteriormente, foi descoberto que os oncogenes apresentavam seqüências muito semelhantes ao DNA das células normais, chegando-se a conclusão que os vírus provocam mudanças na seqüência de DNA da célula normal que foram infectadas. A partir deste achado os genes normais foram chamados de proto-oncogenes.


Os proto-oncogenes podem transformar-se em oncogenes através de duas formas:

- mudanças na estrutura do gene, resultando na síntese de oncoproteínas (produtos genéticos anormais) tendo função aberrante.

- mudanças na regulação da expressão do gene, resultando um aumento ou produção inadequada de proteínas promotoras de crescimento estruturalmente normais.


Mutação em ponto - o oncogene ras é o melhor exemplo de mutação em ponto e está associado a um grande número de tumores humanos. Por exemplo, 90% dos adenocarcinomas pancreáticos, 50% dos cânceres de cólon, endométrio e tireóide e 30% dos adenocarcinomas pulmonares e leucemias mielóides apresentam este tipo de alteração.


Translocação cromossômica - o rearranjo do material genético por translocação cromossômica usualmente resulta em aumento da expressão do proto-oncogene. O melhor exemplo de translocação provocando tumor ocorre no linfoma de Burkitt e resulta no movimento do seguimento contendo c-myc do cromossomo 8 para o cromossomo 14q na banda 32.


Amplificação gênica - a ativação do proto-oncogene associada com aumento da expressão de seus produtos pode resultar da reduplicação do DNA, produzindo várias cópias de proto-oncogene nas células tumorais. O caso mais interessante de amplificação envolve N-myc em neuroblastoma e c-erb B2 em câncer de mama.


Os oncogenes codificam proteínas chamadas oncoproteínas que participam na transdução de sinais durante várias etapas do ciclo celular. Existem 4 categorias de oncogenes que estão associados a divisão celular e desenvolvimento de câncer que são: fator de crescimento, receptor de fator de crescimento, proteínas envolvidas na transdução de sinais e proteínas reguladoras nucleares.


Os genes supressores de tumor (anti-oncogenes) codificam proteínas que inibem a divisão celular. Por desempenharem esta função e terem sido descobertos em estudo de tumores receberam esta denominação. O primeiro gene supressor de tumor descrito foi o Rb o qual está localizado no cromossomo 13q14 e está associado ao desenvolvimento do retinoblastoma, que afeta aproximadamente 1 em 20.000 crianças.


O p53 é o gene supressor de tumor mais comumente relacionado aos cânceres humanos. Alterações nestes genes são encontradas em aproximadamente 70% dos cânceres de cólon, em 30 a 50% dos cânceres de mama e em 50% dos cânceres de pulmão. Além dos tumores epiteliais, mutação no p53 tem sido encontrada em leucemias, linfomas, sarcomas e tumores neurogênicos. Vários genes supressores de tumor envolvidos no desenvolvimento de cânceres humanos estão listados na tabela a seguir.


Os mecanismos pelos quais os genes supressores de tumor inibem a divisão celular são pouco conhecidos. Entretanto, evidências sugerem que os sinais que inibem a divisão celular originam-se fora da célula e utilizam-se de receptores de membrana, proteínas citoplasmáticas e proteínas nucleares para realizarem seus efeitos, como ocorre nos oncogenes.


Câncer de Mama

Sabe-se que o câncer de mama (CM) é mais comum em mulheres, com uma taxa de mortalidade de 10,44 mortes por 100 mil mulheres no Brasil, no período entre 2002 e 2004. Sua maior incidência foi particularmente mais evidenciada em mulheres pós-menopausa. Existem múltiplos fatores de risco associados ao desenvolvimento do CM, tais como: sobrepeso, alcoolismo, alterações hormonais, lesões mamárias em categoria de alto risco e existência de familiares próximos afetados pela enfermidade, sendo o último um dos de maior importância.


Mutações nos genes BRCA1 e BRCA2 são responsáveis por cânceres de mama e ovário hereditários e estão associados ao câncer de mama masculino. Mulheres com mutações do BRCA1, que está localizado no locus 17q21, apresentam 87% de chance de desenvolver carcinoma de mama e 40% a 60% de chance de desenvolver um carcinoma de ovário durante toda a vida, e 65% de chance de desenvolver um segundo carcinoma mamário se viverem até 70 anos . Mulheres com mutação em BRCA2, localizado em 13q12-13, possuem cerca de 85% de chance de desenvolverem um carcinoma de mama durante sua vida.


Além dos genes BRCA1 e BRCA2, vários genes de síndromes multicânceres que incluem o câncer de mama foram identificados. Como exemplo, o gene TP53 causador da síndrome de Li-Fraumeni de câncer de mama hereditário, sarcomas e outros tipos de tumores. Mais recentemente, uma mutação no gene PTEN foi descrita na síndrome Cowden de câncer de mama hereditário e lesões multicutâneas9 . DeVita et al. demonstraram mutações no gene STK11/LKB1 na síndrome de Peutz-Jegher, caracterizada pela presença de pólipos hamartomatosos, câncer de mama, câncer gastrintestinal e câncer reprodutivo; e nos genes MLH1 e MLH2, na síndrome Muir-Torre, que cursa com tumores gastrintestinais, geniturinários e câncer de mama.


Câncer de próstata


O câncer de próstata é uma doença extremamente heterogênea com múltiplos loci contribuindo para sua susceptibilidade. A forma hereditária pode explicar a grande proporção dessa doença entre os homens jovens, ocorrendo em 10% a 20% dos casos do câncer de próstata. No Brasil, foi o responsável pela segunda maior taxa de mortalidade por neoplasia em homens no período entre 2002 e 2004, com 10,31 mortes por 100 mil homens.


Os loci do câncer de próstata foram mapeados nos cromossomos 1q24-25, 1q42, Xq27-28, 1p36 e 20q13. Vários genes mutados estão sendo encontrados no câncer de próstata, tais como: TP53, PTEN, RB ras, CDKN2, AR (receptor de andrógenos) e CTNNB1. A mutação de ponto mais comum foi observada em TP53 e é característica de doenças em estágios avançados. Os genes MSH2 e PMS2 têm sido encontrados com mutação na linhagem celular do câncer de próstata e foi determinado a partir do estudo de famílias com câncer de próstata, com indivíduos acometidos em idade inferior a 66 anos e uma história familiar confirmada de câncer de cérebro primário.


Testes genéticos preventivos serão vitais para a estratégia de prevenção desse tipo de câncer, os quais incluem: mudanças dietéticas, uso de suplementos nutricionais ou de agentes químico-preventivos para alterar a história natural de homens com alto risco de desenvolver câncer de próstata. A utilização do antígeno prostático específico (APE) muito tem contribuído para o diagnóstico precoce de câncer de próstata, proporcionando um melhor prognóstico para o paciente. O aconselhamento genético pode ser utilizado como uma ação de saúde pública para reduzir a morbidade e mortalidade de homens com risco aumentado para câncer de próstata.

Muitos são os tipos de câncer denominados hereditários e estão diretamente relacionados a genética. Um lista dos principais genes envolvidos nesses tipos de câncer está no quadro a seguir. Para mais informações clique aqui.

Referências

DANTAS, Élida Lívia Rafael et al. Genética do Câncer Hereditário. Revista Brasileira de Cancerologia, Juazeiro do Norte, v. 55, n. 3, p.263-269, maio 2009.

BELIZÁRIO, José Ernesto. O próximo desafio: reverter o câncer. Ciência Hoje, São Paulo, v. 31, n. 184, p.50-57, jul. 2002.

et al. Câncer Hereditário. 2015. Disponível em: <http://www.oncoguia.org.br/conteudo/cancer-hereditario/8323/73/>. Acesso em: 07 abr. 2017.


bottom of page